domingo, 30 de agosto de 2009

how my heart behaves - feist

por inventar

uma estranheza e um puxão. estás no meio de uma rua movimentada, numa alienada ausência, não te lembras se ias atravessá-la, ou de que lado vinhas, ou para onde ias, e ficas paralisado, enquanto os outros transeúntes seguem o seu caminho apressado na passadeira, uns no teu sentido, outros no oposto, mas todos seguem sem se quedarem, quem pára no meio de uma rua movimentada de gente e de carros? e o sinal para os peões fica vermelho e tu já és o único no meio da passadeira, no perfeito centro das faixas brancas e pretas, não estás virado para nenhuma das margens mas antes virado de frente, um minúsculo bote afrontando um cargueiro gigantesco num mar violento. é quando alguém te dá um puxão pelo braço, arrasta-te até uma das margens, "você é louco, homem?", e te deixa ali no passeio, algumas pessoas a olharem para ti, tu numa estranheza imensa porque não deverias estar naquele lugar, deverias estar muito longe, num lugar sem carros e sem gente, numa cidade por inventar, banhada por outro oceano.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

interromper

não sei o que me impede de interromper esta viagem nem tão-pouco o que me levaria a interrompê-la. sinto que há quem seja filho de um caminho como de pais reais, com laços de sangue, genes partilhados, vínculos indestrutíveis a ligá-los. há uma conexão irremediável entre mim e o meu caminho? ou é tudo bem mais ténue e frágil que um simples voltar à direita ou à esquerda inicia um caminho novo e o que é agora se desfaz em pó?

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

debaixo do medo

escondes-te debaixo do medo sem saber ao certo o que temes. sabes que te apavoram muitas coisas, umas concretas e palpáveis, outras nem por isso, nem sequer verbalizáveis. mas o medo, como uma capa de doença ou de força, funciona para ti como um abrigo. estando sempre sob a alçada do medo, mais medo que venha apanha-te na sua própria casa, como um convidado. e tu vais vivendo assim, com medo e estranhamente protegido por ele.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

the build up - kings of convenience + feist

fraude

retorno com a sensação de nunca ter sido daqui. e, no entanto, dizem-me: esta é a tua casa, aquela a cadeira onde se sentava a tua mãe, ali o quarto onde dormias, lá fora o pequeno canteiro de flores que pisavas descuidado. mais do que não me lembrar, eu não me reencontro aqui, nenhuma fibra do meu ser emite um sinal, "aqui estás tu", nenhuma sombra que possa reconhecer, nenhum eco. retorno e penso que fraude eu sou, se até o meu passado faz de mim um estranho em mim.

domingo, 2 de agosto de 2009

recuperação

então recuperas um breve fluxo de energia com o mesmo espanto atemorizado com que recuperarias um filho perdido. a medo, duvidando da realidade do momento que estás a viver, medo de não ser verdade, de não seres capaz. e o que vais fazer com essa energia, vais orientá-la para onde, se o teu filho se perdeu há tanto tempo e tu já mal sabes o seu nome?